sábado, 13 de agosto de 2011

A criatividade e o Direito (meio viajado)

O Direito, identificado principalmente por suas leis, seus códigos – seu aspecto positivo – faz com que não acreditemos na sua possibilidade criativa, pelo seu modo preventivo, condutas pré-estabelecidas, enfim, um fenômeno de ordem social. Há um ponto interessante na história do Direito como o vemos hoje que seria o contrato social, instrumento esse que possibilitou um ordenamento social mais justo, na medida em que supostamente se abriria mão de alguns direitos para o benefício dessa ordem social poder atingir igualmente a todos (utopicamente).
Para a formação de um direito, ou do Direito propriamente dito, necessitamos de sujeitos, objetos, relações e coação. Como sabemos, uma norma é composta de preceito mais sanção, sendo que o preceito exprime a ordem, a regra ou o mandado que se deve observar e guardar. Por outro lado, a sanção significa o meio coercitivo disposto pela lei, para que se imponha esse mandado. Tendo em vista isso, é de suma importância ressaltar que o Direito se criou através do homem (o sujeito), com um objeto a ser tutelado, além disso, só existem direitos através das relações humanas. O homem, em sua essência é um ser criativo, segundo Flieger (1978), "manipulamos símbolos ou objetos externos para produzir um evento incomum para nós ou para nosso meio", e seguindo uma definição da criatividade, "criatividade é o processo de tornar-se sensível a problemas, deficiências, lacunas no conhecimento, desarmonia; identificar a dificuldade, buscar soluções, formulando hipóteses a respeito das deficiências; testar e retestar estas hipóteses; e, finalmente, comunicar os resultados" (Torrance, 1965).
O Direito tornou-se sensível aos problemas sociais, às deficiências, às lacunas no conhecimento, a desarmonia como desordem social, procurou identificar essas dificuldades, buscou soluções, formulou hipóteses, testou-as, reformulou-as quando necessário e comunicou o resultado através da justiça. O Direito não teria sua positividade se não fosse escrito por um sujeito, o que faz dele uma criação humana, portanto derivada da criatividade. A raça humana é a única capaz de pensar racionalmente, o que permite que nós, seres humanos possamos modelar o mundo e lidar com efetividade.
O Direito não acompanharia as mudanças sociais se não fosse pela criatividade, até mesmo pelo fato de a criatividade ser o principal motivo do desenvolvimento social, cultural e econômico – meios estes que são tutelados pelo Direito. Então, é impossível dissociar Direito de criatividade, os dois mantém uma relação circular.
Contudo, não é exatamente esse o objetivo desse texto. O verdadeiro ponto a se chegar é a arte. A arte provém da criatividade e não há maneira mais esplêndida de ver a história (completamente ligada ao Direito) senão observando a arte. Ela foi a única esfera a não ser calada, a formadora de ideias e pensamentos, aquela que promoveu as mais diversas revoluções internas e externas nos seres vivos.
Então, a esfera artística é indissociável do mundo jurídico assim como a criatividade (pois dela provém), foi aquela que guardou memórias, o instrumento subjetivo das etapas históricas no mundo – inclusive, também é importante ressaltar que não existe A história, existem histórias, diversos olhares, Hannah Arendt reforça esse conceito de que a história não é única.
O Direito, com todas suas utopias de igualdade, de garantias e principalmente direitos – faz parte da arte, pois cumpre o mesmo papel formador de ideias, pensamentos, guarda também as memórias de um país que busca a democracia real, a democracia em seu sentido puro. Caminhar para essa democracia requer tempo, requer aplicação, requer mentes pensadoras, formadoras. Requer mentes artísticas, criativas, que não se prendam somente às normas, ao positivismo puro. Precisamos de mentes utópicas, que busquem um horizonte quase inalcançável - mas que o busquem – e, assim, continuar avançando. Nas palavras de Eduardo Galeano, "A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar".
E é esse caminhar que vai, um dia, ser o principal motivo da sobreposição entre justiça e criatividade.